segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Let It Be

"And in my hour of darkness
She is standing right in front of me
Speaking words of wisdom, let it be.
Let it be, let it be.
Let it be, let it be.
Whisper words of wisdom, let it be."
Let it be - The Beatles


Não sou muito fã do cara, tenho todo o respeito pelo "conjunto da obra" mas não fã e nem tão pouco sou rata de shows e por esses e mais varios motivos ate eu mesma estranhei quando topei ir, mas gostando ou não: Paul McCartney é Paul McCartney e ir no show dele, que aconteceu nesse domingo, não foi mais uma escolha impulsuva e sim um escolha certeira.

Contrariando os acampadores, chegamos ao estádio do Morumbi poucos minutos antes de abrir os portões e mesmo assim ficamos perto do limite que separava a enorme pista premium da pista comum, escolhemos um canto e ficamos por ali para uma espera de “apenas” 4h já que o Sir, provando ser um legitimo cavaleiro da rainha, não atrasou. O dia estava sendo amaldiçoado pelos invejosos e pela previsão do tempo, mas quem resistiu a John Lennon - que por mais transcendental e brilhante que fosse deveria ser um chato - tem corpo fechado e o clima delicioso se estendeu pelo dia, que fez com a que espera, apesar de longa, fosse suportável e a noite tivesse ventos frios para resfriar um pouco o calor humano da multidão.

As 4 horas se tornaram uma eternidade por que não houve nenhuma banda de entrada, que por mais Roupa Nova que fosse, cairia bem alguma coisa para podermos reclamar enquanto o Paul não chegava.

Então depois de muita espera, pernas cansadas, olhadas feias para o povo que resolvia passar a frente e risadas o Sir entra no estádio vestindo a sua melhor copia de Roberto Carlos com aquele terno azul. Ai foi só sentir a musica reverberando no esterno e pular/gritar. Foram mais de 2h seguidas com um Paul e banda super simpáticos fechando a primeira parte com "Let it Be", "Live and let die" e "Hey Jude", um combo de parar o coração.
Depois quase 1 h de vai e vem: voltando para mais 3 musicas e fingindo que seria definitivo com "Get Back" e depois para o fim definitivo com "Yesterday", "Helter Skelter" e a fantástica "Sgt. Pepper". O show acabou e eu estava arrepiada.

Para mim Paul McCartney provou por que é o Paul McCartney. Não é apenas um cara que fez muito sucesso com a banda de jovens cabeludos e só, provou que aos 68 anos ainda sabe fazer um show de 3h de duração, levantar um estádio inteiro e deixar um gosto de quero muito mais que mesmo para mim, uma não fã, passaria sem reclamar mais 4h de pé esperando.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

...~ Outono ~...

A moça chegou em casa ainda com o pôr do sol. Eram raros os dias que aquela iluminação laranja a levava ate a porta e isso a fazia sorrir por dentro, um sorriso que a tempos não aparecia e que sumiu no mesmo momento em que pisou na sala.
A casa estava escura e com aquele cheiro abafado de ter passado o dia todo trancada, porem o que mais a incomodava era a ausência.
Fazia algumas semanas que ele se fora mas se ela fechasse os olhos ainda podia sentir o calor daquele outro corpo, que tantas vezes pareceu ser continuação do dela, espalhado pela sala e o sentimento era reforçado pela pilha de coisas dele ao lado da porta.
A 1º foto juntos, ele bêbado e ela com um cabelo horrível, o quadro do Star Wars, que gerou tantas brigas antes de ser pendurado do lado oposto ao da Audrey Hepburn, o vinil do Ten, que os embalou em varias tardes de domingo, juntamente com uma camiseta desbotada do Ramones, que também estava na pilha. Inúmeras recordações que ela simplesmente não podia jogar fora mas recordações que a faziam perambular pelo cômodo sem rumo, como se ali não fosse mais sua casa e ela tivesse que reencontrar seu canto, seu lugar, seu lar.
Essa angustia a deixava claustrofóbica e num ímpeto abriu a porta balcão que dava para a varanda.

Uma brisa gelada e os raios alaranjados entraram reivindicando o espaço tantas vezes negado pelo pavor que ele tinha de abrir aquela porta e tomar um golpe de ar fatal, igual ao Brás Cubas.
A casa pareceu agradecer a energia do sol devolvendo, por um momento, o sentimento de lar que a moça buscava, ela, como se estivesse renascendo, respirou fundo deixando a ar gelado encher seus pulmões e chicotear seu rosto.

Agora era ela e só ela e por isso a varanda permaneceria aberta.

domingo, 15 de agosto de 2010

~ Reflexões ~

Morava com eles, mas não os entendia. Não me entendam mal não estou julgando se são bons ou ruins só digo que não fazem sentido algum. Afinal porque levantar antes do sol nascer se não vai apreciá-lo? Ao invés disso resolvem jogar uma água sobre o corpo para retirar aquele odor que exalam, depois saem e só voltam após o por do sol, e pela cara que estão quando chegam devem ter perdido esse espetáculo também e posso apostar que não tiveram o prazer de sentir os raios quentes e iluminados em suas peles. Sentam-se em frente a uma caixa com luzes e sons e passam a olhar para ela por horas a fio, há também coisas boas como as comidas cheirosas que fazem e que tento roubar, mas às vezes eles só esquentam os pratos e comem mecanicamente. Às vezes recebem gente estranha, às vezes não.
Mas de todas as suas estranhezas a que mais me estarrece é quando a lua está no meio do céu, brilhando com centenas de estrelas em volta, ou seja, no melhor da festa, eles arrumam seus relógios barulhentos se enfiam debaixo dos cobertores e vão dormir. Dizem que são felizes com todas aquelas coisas que trazem para casa apesar de usar poucas delas e nunca aproveitarem o dia de verdade, não posso julga-los sobre isso, só que, sinceramente, entre a minha vida e a deles prefiro muito mais a minha, mas o que eu sei né?! Afinal sou apenas um gato.

domingo, 16 de maio de 2010

Castelo

Ela suspirou e sentou sozinha a mesa pronta para encará-los.
Já fazia um bom tempo desde a última vez que se deparou com eles e achava que já estivesse forte o suficiente para não precisar fazer mais isso.
E eles foram chegando, um a um. Alguns conseguiram sentar, outros ficaram de pé e outros ficaram em cima de outros, quando por fim o ultimo se acomodou espremidinho, a sala estava cheia.
Todos contra ela e ela sozinha.
Quiseram acusá-la ao mesmo tempo, mas ela não ouviu nada, só via a movimentação frenética mas não havia som, os mais nervosos a cutucavam tentando lhe chamar a atenção e ela via apenas o vulto gesticulando e as bocas mexendo sem parar só que mesmo assim não entendia. Pensou que estivesse surda, inutilmente fez movimentos e gestos, mas nenhum deles queria ouvi-la, só falavam.

"Inércia"

A única coisa que ouviu. Tentou procurar entre todos quem conseguia falar ou quem ela conseguia ouvir, mas os rostos estavam mais agressivos, o que antes eram cutucões viraram puxões.
Seus olhos esquadrilhavam o lugar ate que observou um deles. Era menor, parecia ser bem mais novo que os outros. Estava sentado em uma cadeira, seus pés não alcançavam o chão e por isso ele os balançava enquanto observava o ritmo dos seus cadarços. Tirou os olhos dos pés e a encarou.
Olho no olho.

"Inércia. É esse o seu medo"

Todos os outros sumiram e na sala apenas restaram ela e aquele jovem e não conhecido fantasma.

"Não uma situação de inércia que você teme. Você é batalhadora. Corre por todos os lados quando quer, abraça o mundo e um pouco mais, as vezes corre mais do que deveria ou ate precisaria. É uma lutadora, por isso não é dessa inércia que tem medo. Você tem medo da calma ai dentro" Tocou no peito da garota, no lugar do coração, e o frio tomou conta do corpo dela todo."é esse frio que você teme. Você não se apegava a ninguém e morre de medo de voltar a ser assim. Sua indiferença sempre foi o seu grande trunfo para encarar o mundo mas agora se tornou seu maior defeito. Você vê o mundo se fechar e apesar de ser confortável sabe que sentirá saudades do sol”
Ela deu uns passos para trás como se não acreditasse em uma palavra daquilo
“E não adianta essa cara de indignada. Você sabe muito bem que estou certo. Anda evitando pessoas com quem pode ser você mesma, prefere a companhia de todos que aceitam sua “máscara do dia”.
A garota recuou tentando fugir daquela realidade. Tentou gritar blasfêmias, tentou negar todas aquelas palavras, mas não saiu voz. Ela não podia negar aquilo, não ali. Não podia negar porque seria uma mentira e uma vez fez um acordo, com esses mesmos fantasmas, que seria sincera ao menos naquele lugar.
O jovem a circundou com um sorriso de deboche. “eu te disse. Você sabe que é esse seu medo. E deve ate saber como lutar contra isso, só que não quer"
"Eu quero, só não sei" A voz saiu rouca e arranhou sua garganta.
"Não sabe mesmo? Tem certeza? Que tal parar de fugir de quem quer te ajudar? Que tal abrir a sua alma a quem se mostra receptivo a recebê-la? Você esta sendo covarde e o pior, sendo NOVAMENTE covarde!"
A garota abaixou os olhos
"Só porque se machucou acha que agora é melhor se fechar? Quantas e quantas pessoas já sofreram? E ainda vivem e ainda se entregam e ainda são transparentes. Você está regredindo e sabe disso. Pare de tentar ser super, pare de tentar só pisar em terreno firme e novamente se abra. O céu é mais brilhante desse lado e você sabe disso.” O jovem afagou a cabeça da moça. "Tenha coragem, ao menos dessa vez."

A garota continuou estática, de cabeça baixa e agora com um buraco no lugar do coração.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

~ Inverno ~

"Waitin', watchin' the clock, it's four o'clock, it's got to stop
Tell him, take no more, she practices her speech
As he opens the door, she rolls over..
pretends to sleep as he looks her over.."
Better Man - Pearl Jam


Era tarde da noite quando ele entrou. Entre tropeços, xingamentos abafados e risadas solitárias. Tentou não acordá-la enquanto entrava na cama, mas era desnecessário já que ela não havia pregado o olho. O vento gelado que se escondeu embaixo das cobertas enquanto ele entrava fez o corpo dela tremer espontaneamente, algo que ele notaria se não estivesse tão alto.
Não encostou seu corpo no dela, não por preocupação e sim por falta de vontade e ela se sentiu aliviada quando ele virou para o outro lado.
Ela não quis lhe perguntar nada, preferiu fingir que dormia e evitar mais uma briga e ele preferia chegar em casa depois que ela já estivesse dormido para não encarar mais uma discussão.
Ele se enchia de álcool e ela de remédio.
Para ela, a carência era ignorada com trabalho, chocolate e monografia e ele só se sentia realizado entre as pernas de outra.

Em poucos minutos ele já estava dormindo e ela continuava acordada.