domingo, 6 de setembro de 2009

.*. Primavera .*.

“Tengo un son repleto de ritmos y sentimientos…
Se te mete dentro como lo hace mi guitarra…
Como primavera lanza flores en tus alas…
Sal para la buena… ¡y te llenará de ganas!”
Hay un son - Orishas


Nunca gostei muito do calor, mas considero esse tempo uma ode à vida desregrada, perde-se o sono e a fome, bebidas geladas, principalmente as alcoólicas, se tornam mais convidativas, a preguiça toma conta do dia inteiro e as noites são deliciosas insistindo para ficarmos sempre mais um pouco a luz da lua.
E foi numa noite quente de primavera que eu o conheci.
Entrei em um boteco bem velho, daqueles que a poeira e sujeira nos pisos podem contar a historia do lugar desde a inauguração, não que este seja um local que eu frequentaria, mas numa noite quente onde os pés se recusam a dirigirem-se para a casa, qualquer porta aberta parece ser um lugar melhor.
Ao entrar encarei um grupo pequeno porem animado de pessoas, elas já estavam familiarizadas com o lugar e chamavam o garçom/balconista/dono pelo nome e algumas das garotas ate por um apelido carinhoso. Cheguei de mansinho tentando me mimetizar com a parede, fui para um canto escuro perto do balcão esperando ser atendida. Estava absorta em meus pensamentos, olhando para os quadros velhos pendurados próximos de onde estava.
“Se ficar por aqui nunca será atendida”
Olhei para o lado sobressaltada e lá estava ele, não era bonito mas tinha o charme que todo homem boêmio tem. Cabelo desajeitado, barba rala e um cheiro de álcool e cigarro. “sente-se lá com a gente. Somos a única mesa do lugar mesmo.” Ele sorriu com o canto da boca. Tentei balbuciar algum protesto delicado, mas ele já tinha colocado um copo cheio de cerveja na minha mão e voltado para a mesa olhando pra trás de forma convidativa.
Me dirigi ao lugar num misto de contrariedade e vergonha, quando estava me aproximando da mesa fui chamada por um dos rapazes para tomar partido em uma discussão que ele travava com o dono do bar “Vale ou não vale roubar no poker” meio em duvida sobre o que responder balbuciei “Se ninguém perceber...” foi mais que o suficiente para explodir a mesa em gargalhadas e fazer com que o velho levantasse contrariado resmungando algo como ser esse o motivo de não jogar com os jovens. Sentei na cadeira que ele deixou vaga e só me lembro da conversa ter sido fácil com eles.
Não me lembro de ter me apresentado e nem de ter perguntado por nomes, isso não era importante e cada garrafa de cerveja nos distanciava mais dessas formalidades.
As pessoas foram indo pouco a pouco, com o passar das horas, ate que, quase com o sol nascendo, restavam na mesa apenas eu, o dono do bar, o boêmio e uma garota que reclamava de sono.
“Bem, acho que já esta na hora de ir” falei ao mesmo tempo em que levantava de forma desastrada derrubando alguns copos pela mesa.
“Tem certeza que consegue ir sozinha?” ele me olhava com um sorriso debochado por ver a forma ineficiente que eu tentava ficar de pé.
“Claro!”.
Ele apenas sorriu balançando a cabeça. “Se vai, vamos todos que o seu Osiras já quer ir pra casa dormir, né?!”. O velho balbuciou palavras gentis, porem claramente falsas fazendo com que nós três ríssemos da tentativa frustrada dele em ser educado.
“Espera só um minuto. Vou ao banheiro”, fui trombando em algumas cadeiras que estavam na minha frente ate conseguir chegar ao corredor que dava acesso aos banheiros.
Não posso calcular o quanto fiquei lá dentro, mas sei que foi tempo suficiente para me enroscar com a torneira que se recusava a ficar fechada.
Quando finalmente consegui sair me deparei com o rapaz e em meio a um sorriso disse:
“Demorei tanto assim que veio me buscar...” porem antes que eu pudesse terminar a frase ele me agarrou colando sua boca na minha e me grudou na parede.
Meu coração disparou e só consegui passar minhas mãos pelos seus cabelos desarrumando-os ainda mais e retribuir ao beijo na forma mais intensa possível.

Não sei se foi a sensação do tempo distorcida pelo álcool ou se realmente foi algo rápido, mas quando consegui voltar a respirar e focar o olhar ele já estava na saída do corredor olhando para mim com um sorriso malicioso.
Respirei fundo e caminhei em direção a porta ainda mais cambaleante que antes, o rapaz estava acordando a moça que cochilou em cima da mesa. Saímos os 3 ao mesmo tempo do bar ajudando o seu Osiras a fechá-lo. O sol já despontava seus primeiros raios quando me despedi do boêmio e da garota empoleirada em seu braço, que demorei para perceber que era sua namorada.
Tomamos rumos opostos e cheguei em casa ainda com a briga interna de ter gostado do beijo e querer mais... muito mais, e a consciência pesada por saber que ele era comprometido.

Mas agora confesso que o peso na consciência não durou por muito tempo, afinal nada como uma noite quente e um boêmio cachorro para fazer com que eu mande as favas a “moral e os bons costumes”.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Don't go away

"When I get to Warwick Avenue
Please drop the past and be true
Don’t think we’re okay
Just because I’m here
You hurt me bad but I won't shed a tear"
Warwick Avenue - Duffy


Tinha escolhido uma mesa do lado de fora pois sabia que ela adorava o brilho do sol aquela hora no outono, quando a garota chegou ele, de forma desajeitada, levantou-se mas ela simplesmente fez um “oi” com um aceno de cabeça e sentou a sua frente. O silencio foi quebrado pelo garçom entregando os cardápios e dizendo que era para chamar assim que escolhessem:
- Acho que vou pedir um chocolate quente.
- Não quer mais nada? Aqui tem aquela torta holandesa que você adora. – disse o rapaz tentando quebrar o gelo.
- Não. Só o chocolate mesmo. – por mais que gostasse estava com o estomago revirado para conseguir comer alguma coisa.
Fizeram os pedidos e ficaram em silencio.
- Obrigado por ter vindo. Por ter me dado a chance de explicar.
- Não poderia ser diferente. É injusto não deixar.
- Você está fria
- Não
- Está sim. Não queria que estivesse assim.
- Deveria ter pensado antes
- Não queria te machucar...
- Tarde demais pra isso.
- Terminei com ela. Quero ficar com você.
Ela olhou para o lado desviando o olhar e fitando o sol que começava a se pôr
- Não vai dizer nada?
- Não tenho o que dizer. Imaginei você me falando isso tantas e tantas vezes. Desejei tanto. Quis tanto... mas agora... não sei.
- Não consigo viver sem você.
- E eu não consigo viver com você.
Ele abaixou a cabeça e brincou com a espuma em cima do cappuccino.
- Você disse que eu era livre...
- É não é? Escolheu o que tinha que escolher.
- Mas foi uma escolha errada. Agora quero ficar com você
- Não, você nunca me escolheu. Eu sou a segunda opção. Sempre fui...
- Nunca foi a segunda... sempre foi a primeira.
Ela sorri com o canto da boca de forma descrente.
- Você nunca acredita em mim. Às vezes me pergunto se um dia chegou a acreditar.
- Acha que estaria aqui se não houvesse acreditado, ao menos, uma única vez?
Ela era esperta, isso ele tinha que admitir. Sempre rápida em suas respostas e geralmente o deixando sem palavras.
O silencio pairou sobre eles outra vez.
- É o fim?
- Não temos outra escolha...
- Não quero.
- Não temos outra escolha.
- Temos sim. Você tem. Por favor.
- Não tenho outra escolha.
Ele abaixou a cabeça e ela pode ver algumas gotas caírem sobre a toalha. A garota deu um suspiro dolorido, deixou o dinheiro do chocolate em cima da mesa e simplesmente partiu.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Beauty mark

"5:55
soon the morning will arrive
can i begin another day
whilst this old day is still alive
refusing to be put away"
5:55 - Charlotte Gainsbourg


O apartamento estava escuro, mas não ligou nenhuma luz apenas abriu a sacada e deixou que o brilho branco da lua iluminase o lugar. Foi ate a geladeira e pegou um cerveja, sentou-se na varanda, acendeu um cigarro enquanto no mp3 tocava Bessie Smith. Pousou os olhos de forma distraida para a rua.
Pessoas entrando e saindo do bar na frente, o senhorio do prédio brigando com uns meninos por algum motivo que ela ignorava, o balconista da padaria passou e lhe fez um aceno rapido, ela apenas respondeu caindo a cabeça de leve.

O ar quente lhe enchia os pulmões e a nicotina sua cabeça.

“Mudar dói, mas não mudar dói muito” era a única frase que tentava se concentrar. Não queria encontrar ninguém, rezava para não precisar cruzar olhares enquanto descia as escadas. Sempre foi boa em chegar nunca em partir.

Tomou o último gole da cerveja ao mesmo tempo em que tocavam os acordes finais de “Me and my Gin”. Ela consultou o relógio de pulso. Já estava na hora. Apagou o cigarro no vaso a sua frente, deixando a bituca junto com outras que estavam ali há bastante tempo. Levantou-se e caminhou pelo ambiente vazio ate a porta pegando a mala já arrumada que estava ao lado. Deu uma ultima olhada e admirou a beleza do luar entrando pela janela, em um respiro profundo saiu para não mais voltar.

Ninguém soube o por que. A discussão por semanas foram os possíveis motivos que fizeram a moradora do 203 se mudar de forma tão repentina. Nunca chegaram a um acordo, porém concordavam que sentiam falta do perfume de jasmim que ficava no elevador, do belo sorriso pela manhã e principalmente daquela pintinha discreta abaixo do olho direito.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Que não seja imortal, posto que é chama

"Dá pra imaginar por que eu estou aqui?
A verdade de repente tomou conta de mim
Minha defesa agora quero apresentar
Admito simplesmente que me arrependi"
Kid Abelha - Combinação


Ela estava pronta.
Cabelo cuidadosamente escovado, maquiagem feita com esmero, a roupa escolhida de forma a parecer provocante, mas não vulgar.
E ele?!
Ele estava atrasado. 1h e 26....27 minutos.

Não podia acreditar que tomara um bolo. Logo agora que tudo parecia estar se resolvendo...
Conteve as lágrimas, ele talvez aparecesse ou ligasse, não podia borrar o rímel.

O telefone toca.
Corre para atender. Escuta uma voz feminina do outro lado.
“Se estou desocupada... É...”
Se ele aparecer, que se foda!
“Não estou. 15 minutos?! Esta ótimo!”
Retocou o rímel, jogou mais uma borrifada do perfume doce e trocou a blusa por uma mais decotada.

4:28am.

"I don't know what you do but you do it well, I'm under your spell"
"I don't know what you do but you do it well, I'm under your spell"
"I don't know what you do but you do it well, I'm under your spell"

O celular toca dentro da bolsa jogada no sofá.
Ela?!
Esta no quarto.
Arranhando as costas de outro.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Sabrina

A personagem é dele por esse texto q esta linkado. Espero q não se incomode, é que depois q eu li, me veio essa historia na cabeça...

***

O velho elevador abriu as portas no 8º andar, a garota saiu e caminhou ate um apartamento. Era pequeno, de apenas 1 dormitório, mas agora se sentia um pouco mais ela. A volta foi como se estivesse em outro corpo, sentia como se aquilo não lhe pertensesse mais. Fitou-se pelo espelho da sala, mas logo virou o rosto. Sentiu um asco quase insuportável.
Se abraçou como se tentasse se proteger de algo invisível. Tentou se proteger dela mesma. A vontade de chorar novamente aparecer "Seja forte, Adriana. Seja forte!" dizia para si mesma.
Foi ate o banheiro e ligou o chuveiro. Talvez precisasse tomar um banho para tirar todo esse cheiro, para ser mais Dri e menos Sabrina.

Sentiu a água quente bater em seus ombros. Não se mexeu, só sentiu a água correr. Não estava com coragem de encostar no próprio corpo.
A visão dele abrindo a porta do carro e a olhando lhe surgiu na memória.
Começou a se esfregar
Sentia nojo daquilo. Nojo dele. Nojo dela.
E todo o quadro lhe fez na mente.
Aqueles dedos grossos passando por sua coxa, o cheiro de cigarro velho, os cabelos grisalhos já ralos, o olhar, o dinheiro arremessado aos lençóis, os falsos sorrisos, os falsos gemidos....
Se esfregava mais forte. Não queria apenas tirar o cheiro, queria sumir com aquelas lembranças.

Ouviu o barulho na porta. Desligou o chuveiro
"Raquel?!"
"Sim, Dri. Sou eu."
Encostou a cabeça na parede mesmo com o chuveiro desligado. Rezava para Deus perdoar o seu pecado e pedia que ele fizesse o celular não tocar mais.
Mas no mesmo minuto ouvi o som estridente de uma musiquinha quase alegre.
"Alô, sim sim. Pode falar. Claro. Me passe o endereço. Tá, passarei para ela. Pode confiar, você não vai se arrepender"
Ouvi passos e uma batida na porta
"Dri, mais um. E esse parece dos grandes. Marcou como você em um lugar super chique"
Adriana saiu do banho como um bichinho assustado, ao pousar os olhos sobre ela Raquel pareceu entender. Tirou um pacotinho da bolsa e jogou para a garota.
"Sei que você dirá não agora, mas confie em mim, só assim vai conseguir sair desse apartamento hoje"

Eram 4:30 quando Adriana voltou para o apartamente aquela noite. O nariz ainda ardia um pouco e a euforia acabará. Ela abriu a porta, não ligou a luz, só encostou no canto da parede deslizando ate sentar no chão, abraçou suas pernas se encolhendo e simplesmente chorou.